O mês de abril foi, certamente, um dos mais movimentados e esperados em se tratando de shows de rock. Primeiramente porque, no penúltimo sábado do mês, tivemos, após oito anos de hiato, a sétima edição do Monsters of Rock em São Paulo, com um dos melhores line-ups já escalados para esse festival. Mas o último final de semana de abril certamente entrará para a história com a 1° edição do Summer Breeze Brasil, não apenas na história do rock, mas também dos eventos musicais, principalmente por trazer um formato muito utilizado nos festivais europeus, e que foi muito bem recebido por quem compareceu ao evento.
Esse tipo de evento, aliás, costuma ocorrer na Europa em fazendas situadas em localidades afastadas dos grandes centros urbanos. O local escolhido para sediar a 1° edição do Summer Breeze fora da Alemanha foi o Memorial da América, local já conhecido dos paulistanos por ter abrigado outros eventos de grande porte, além de estar em uma localização estratégica – ao lado de uma estação de metrô e de um terminal interestadual, o que facilitaria a volta para casa para quem comparecesse ao festival.
E quem compareceu teve acesso a exposições (como a Horror Expo), stands de tatuagem, de vendas de CD’s / vinis / camisetas, merchandising oficial, gastronomia para todos os gostos, área de lazer para crianças, além de muita música, em uma estrutura de primeira qualidade.
Lá dentro, havia sinalizações em quatro idiomas (português, alemão, inglês e espanhol) para que o público pudesse se localizar. Porém, foi possível notar que algumas pessoas que pagaram ingresso normal do evento não sabiam que não tinham acesso ao Waves Stage, palco / auditório dedicado a apresentações específicas, o que deixou alguns presentes que pensavam em ver no 1° dia bandas como Tuatha de Danann ou Apokalyptica desanimados com essa informação.
Falando agora de música, é importante salientar que o festival contou com cerca de 40 atrações musicais nos dois dias, espalhados em quatro palcos – além do já citado e exclusivo Waves Stage, os palcos “gêmeos” e principais Hot Stage e Ice Stage, e o Sun Stage – e muitas dessas atrações simultâneas, sendo impossível estar presente e relatar tudo o que aconteceu. Sendo assim, nas próximas linhas, segue um resumo do que pude presenciar nesse final de semana.
29 de abril – 1° dia
Programado para começar às 11h, sem atrasos e com um público pequeno, a banda alemã Voodoo Kiss foi a responsável por inaugurar não só o Summer Breeze Brasil, mas também o Hot Stage. Vale mencionar que trata-se da banda de Achim Ostertag, fundador do Summer Breeze na Alemanha, e aqui baterista. A banda esteve na ativa entre 1995 e 2000 e retornou em 2022 quando lançou seu primeiro álbum, de mesmo nome que foi a base do show, incluindo músicas como o single “The Beauty and the Beast”, que abriu o show, “Killer” e “Prisoner”. Destaque para a dupla de vocalistas, Gerrit Mutz e Steffi Stuber.
Na sequência, no Sun Stage, o Brutal Brega, banda formada por João Gordo e Val Santos, apresentou versões de músicas bregas famosas em versões punk rock e metal. A intro trouxe vinhetas de radialistas conhecidos das rádios AM, como Zé Betio e Eli Correa (do bordão “Oi gente!”). Foi divertido ver os metaleiros cantando “Fuscão Preto”, “Ciganinha”, “Feiticeira” e “Sandra Rosa Madalena” entre outras do nosso cancioneiro brega, e Gordo contando fatos como o apelido que recebeu por conta de uma personagem de uma novela da época (que tinha várias destas canções em sua trilha sonora).
Era 12h e foi possível presenciar a primeira avalanche sonora do festival com o Benediction, que fez um dos shows mais elogiados do festival. “Divine Ultimatum” deu início à apresentação dos ingleses no Ice Stage. Entre uma música e outra, Dave Ingram tomava um gole de cerveja e convidava o público a ficar bêbado. Mencionou que o álbum “Transcend the Rubicon”, do qual participou em sua primeira passagem na banda junto aos guitarristas fundadores Darren Brooks e Peter Rew, estava completando três décadas este ano, e deste álbum, tocaram “Unfound Mortality”, “Nightfear” e “I bow to none”. Do novo e ótimo “Scricptures” foram executadas “Stormcrow”, “Scriptures in Sccarlet” e “Progenitors of a New Paradigm”, e não faltaram clássicos do “Benê” como “Jumping at Shadows”, “Vision in the Shroud”, “The Grotesque” e “Subconscious Terror”.
Quem estava assistindo ao Benediction imediatamente, ao final, se deslocou ao Sun Stage – que ficou com seu entorno lotado rapidamente – para ver a apresentação das meninas do Crypta. Fernanda Lira (baixo, voz), Tainá Bergamaschi (guitarra), Jéssica Falchi (guitarra) e Luana Dametto (bateria), de volta ao país após sua primeira turnê estadunidense, entraram com sangue nos olhos no palco. O microfone da Fernanda não funcionou em “Death Arcana” e “Possessed”, mas em “Kali” (deusa da destruição e do renascimento, dedica às mulheres por Fernanda) tudo se normalizou, e foi possível ouvir seus vocais rasgados. O álbum “Echoes of the Soul” foi executado na íntegra, juntamente com o novo single, “I resign”.
No Ice Stage, com um certo atraso (que infelizmente impossibilitou que pudesse ver e registrar o show da Tuatha de Danann no Waves Stage), o Viper subiu ao palco para dar início à homenagem ao vocalista Andre Matos. A nova “Under the Sun”, além da clássica “A Cry from the Edge” e o hino “Living for the Night”, ambas do álbum “Theatre of Fate”, de 1989, foram executadas. A segunda, inclusive, com a plateia cantando, como é de praxe nas apresentações da banda.
Os caras do Viper se retiram do palco e, na sequência, Alírio Neto, Hugo Mariutti, Luís Mariutti e Fabio Ribeiro, acompanhados do baterista Rodrigo Oliveira (Korzus), substituindo Ricardo Confessori, sobem ao palco, para fazer aquela que pode ser uma das últimas (se não for a derradeira) apresentação do Shaman. Com apoio de Rafael Bittencourt e Felipe Andreoli (Angra) deram início com “Lisbon”. “Make believe”, “Turn Away”, “For Tomorrow”, “Fairy Tale” e “Carry On” (com Felipe do Viper também no palco) encerraram a homenagem merecida a Andre.
O Skid Row fez milhares de pessoas voltar no tempo com seu hard e clássicos como “Slave to the Grind”, “18 and Life”, “In a Darkened Room”, “Monkey Business” e “Youth Gone Wild”. O vocalista Erik Grönwall não só canta bem, como é um show à parte, sempre interagindo com a plateia, fazendo caras e poses para os celulares, e mostrou-se estar à altura de cantar ao lado de Rachel Bolan (baixo), Scotti Hill, Dave Sabo (guitarristas) e Rob Hammersmith (bateria), e da posição que por anos foi de Sebastian Bach.
Depois foi a vez do Sepultura que como sempre, fez um show competente, com músicas do mais recente trabalho “Quadra” de 2020 – como “Isolation”, “Means to an End”, “Guardians of Earth” e “Agony of Defeat”. E não faltaram as clássicas “Territory”, “Propaganda”, “Refuse / Resist”, “Arise” e “Roots Bloody Roots”. Não à toa é uma das bandas brasileiras mais respeitadas mundo afora.
Já era de noite quando o Accept subiu ao Sun Stage. O sexteto, formado por Wolf Hoffman (guitarra), Mark Tornillo (voz), Uwe Lulis (guitarra), Philip Shouse (guitarra), Martin Motnik (baixo) e Christopher Williams (bateria) começaram com “Zombie Apocalypse” e “Symphony of Pain” do álbum “Too Mean to Die” de 2021. Deste álbum, também foi executada “Overnight Sensation”. E, obviamente, não faltaram as clássicas “Restless and Wild“, “Breaker”, “Princess of the Dawn”, “Midnight Mover”, “Fast as a Shark”, “Metal Heart” e “Balls to the Wall”.
Pontualmente às 20:05, os bardos sobem ao palco Hot Stage para fazer o principal show da noite: era hora dos alemães do Blind Guardian executarem seus hinos. A abertura não poderia ser melhor para os fãs, com “Imaginations from the Other Side”, do álbum homônimo de 1995. Após a canção, Hansi Kursh se dirigiu à plateia que lotava a pista em frente ao palco, dizendo que há muito tempo não vinham ao país, e que pretendiam voltar anualmente pra cá – para o delírio dos fãs – e anunciando, na sequência, “Welcome to Dying”.
Após uma dobradinha do álbum “Nightfall in Middle Earth” – “Nightfall” e “Time Stands Still (At the Iron Hill)”, o telão passou a mostrar a ilustração do álbum “Somewhere Far Beyoond”, que completou, em 2022, 30 anos de seu lançamento, e tem sido executado na íntegra nos shows da banda como headliner. E este sábado, para delírio dos fãs não foi diferente! Sendo assim, “Time what is Time”, “Journey Through the Dark”, “Theatre of Pain”, “Somewhere Far Beyond” foram algumas das músicas celebradas pelos fãs. As duas partes de “The Bard’s Song” são um caso à parte, pois aqui o nível de sintonia entre banda e fãs se eleva a um nível inimaginável, primeiramente com a já tradicional “In The Forest”, em que Hansi joga pra galera (ele mesmo comentou que os fãs deixam seu trabalho mais fácil), e na sequência com a emocionante “The Hobbit”.
É importante destacar que Hansi Kursh está mais solto e, sem a necessidade de tocar baixo ao vivo, tornou-se um frontman de primeira, comandando com a maestria a plateia – e cantando maravilhosamente bem, mesmo as partes que exigem mais de sua voz. A dupla de guitarristas, André Olbrich e Marcus Siepen estava afinadíssima e perfeita em suas notas. O baterista Frederik Ehmke certeiro em sua percussão. E destaco também o trabalho dos músicos de apoio, Michael Schüren (teclado) e Johan van Stratum (baixo, Stream of Passion, Vuur).
Após essa catarse chamada “Somewhere Far Beyond”, “Lord of the Rings” foi executada (outro show da plateia), a nova “Violent Shadows” e, para alegria dos fãs old school a pré-histórica “Majesty”, com sua intro a la parque de diversões, fecharam a parte regular da apresentação.
Mas os alemães não poderiam ir embora sem executar a épica “Valhalla”, com seu epílogo tradicional cantando pelos fãs. Na sequência, “Mirror Mirror” deu números finais à apresentação da banda, que fechou em grande estilo as apresentações do dia nos palcos gigantes.
Para aqueles que tiveram disposição (e, obviamente, pagaram mais), no Auditório do Memorial, que sediou o Waves Stage, ocorreu a apresentação dos finlandeses do Apocalyptica, que executaram músicas próprias, além dos tradicionais covers de Sepultura e Metallica – e que trouxeram o cantor Franky Perez e a cantora Simone Simons como convidados especiais.
30 de abril – 2 ° dia
Se no 1° dia do evento, segundo a previsão do tempo, poderíamos ter no período da tarde chuvas isoladas (o que não ocorreu), para o domingo a possibilidade de chuva era nula. E aliás, a temperatura foi mais quente que a da véspera. E já peço desculpas adiantadamente, pois irei utilizar em exaustão adjetivos sobre a temperatura em meu relato.
O inferno na terra começou cedo com o Krisiun abrindo os trabalhos no Hot Stage. O Memorial estava mais lotado neste horário em relação ao dia anterior, obviamente por conta dos irmãos Alex Camargo (baixo, voz), Moyses Kolesne (guitarra) e Max Kolesne (bateria). “Ravager”, “Combustion Inferno”, “Apocalyptic Victory”, “Hatred Inherit” e um cover de “Ace of Spades”, do Motörhead, foram executados nessa manhã, em um show sempre competente do trio.
O Grave Digger veio na sequência tocando músicas de todas as fases, desde as recentes “Lawbreaker” e “Hell Is My Purgatory” como “The Dark of the Sun” ou “Rebellion (The Clans Are Marching)” do álbum “Tunes of War”. Não faltou a clássica “Heavy Metal Breakdown” para encerrar a apresentação da banda, formada pelo vocalista e membro fundador Chris Boltendahl, Jens Becker (baixo), Axel Ritt (guitarra) e Marcus Kniep (bateria).
O Project46, com letras em português, colocou o Sun Stage abaixo, com “Violência gratuita”, “Dor”, “Corre”, “Foda-se (Se depender de nós)” e “Acorda pra vida” pra citar algumas das executadas nesta tarde pelo quinteto Caio MacBeserra (voz), Jean Patton (guitarra), Vinicius Castellari (guitarra), Baffo Neto (baixo) e Betto Cardoso (bateria).
Pra aquecer um pouco mais a plateia do Summer Breeze nesse domingo, os auto falantes tocaram “The heat is on” do cantor Glenn Frey – música que ficou famosa no Brasil por fazer parte da trilha sonora do filme “Um tira da pesada” – para anunciar o quinteto sueco H.E.A.T, que “esquentou” a galera com seu hard rock, com a ótima presença de palco do vocalista Kenny Leckremo, e com “Back to the Rhythm”, “Rock Your Body”, “1000 Miles” entre outras.
Na sequência, dei uma passada no Waves Stage e vi uma parte do show da banda Vixen. Mesmo bandas veteranas podem encontrar contratempos, e neste domingo a banda precisou fazer a checagem de som na hora, o que atrasou um pouco a apresentação. Mas quando começou, Lorraine Lewis (vocal), Roxy Petrucci (bateria), Britt Lightning (guitarra) e a brasileira Julia Lage (baixo) fizeram valer a espera.
O Testament veio na sequência. Chuck Billy (vocal), Eric Peterson, Alex Skolnick (guitarristas), Steve DiGiorgio (baixo) e Chris Dovas (bateria) agitaram o Hot Stage com os clássicos “The New Order”, “Over the Wall”, “Into the pit” e mais recentes como “Children of the Next Level” e “The Formation of Damnation” – esta com direito a “wall of death”.
O The Winery Dogs, apesar do virtuosismo de seus integrantes, entregou um show sem rodeios e eficiente. Ritchie Kotzen, Billy Sheehan e Mike Portnoy, além de excelentes músicos, possuem uma sinergia enorme no palco e agradaram em cheio o público que os esperava para assisti-los. O set-list contou com onze músicas, distribuídas entre seus três álbuns de estúdio.
O Kreator foi a atração seguinte, e fez um show digno de headliner. Foi possível ver, durante a apresentação dos alemães, a primeira e mais grandiosa até então produção de palco, como um backdrop gigantesco à frente do telão, bonecos empalados posicionados nas laterais do palco, e enforcados ao fundo, um enorme busto da mascote da banda, posicionado atrás da bateria de Ventor, e efeitos pirotécnicos entre algumas canções, tais como “Hate übber alles”, “Satan is Real” e “Hordes of Chaos (A Necrologue for the Elite)”. “People of the Lie”, e as old school “Flag of Hate” e a derradeira “Pleasure to Kill” também foram executadas nesse fim de tarde pela banda, comandada por Mille Petrozza (guitarra, voz) e completada por Sami Yli-Sirniö (guitarra) e Frédéric Leclercq (baixo).
Uma avalanche sonora chamada Napalm Death passou pelo Sun Stage na sequência. Difícil explicar o quão foi caótica, barulhenta e ótima a apresentação dos ingleses. São mais de trinta e cinco anos na estrada, e toda a carreira foi resumida nesse show (que não teve Shane Embury tocando – por estar doente, não viajou para a América do Sul) que contou com “Scum”, “Siege of Power”, “Suffer the children”, “Contagion”, “Fuck the Factoid”, “Lucid Fairytale”, “You suffer” e o tradicional cover do Dead Kennedys, “Nazi Punks Fuck Off”, dentre as cerca de vinte canções executadas pela banda em quase uma hora de apresentação.
O último headliner do Hot Stage subiu ao palco às 20h05 para esquentar mais ainda a noite. Os australianos do Parkway Drive fizeram um show que agradou os fãs da banda. O palco sem produção, apenas com contraluz direcionada nos integrantes e luzes duras, além dos canhões de luzes estroboscópicas direcionados à plateia e abaixo de praticáveis onde os músicos se localizavam contrastou perfeitamente com o som pesado e denso da banda. E, para completar, como é de praxe na apresentação da banda, labaredas gigantescas de fogo, que cobriram praticamente o palco por completo – e assustaram aqueles que não as esperavam – durante a execução de “Glitch”.
Mas ainda havia tempo para outro headliner. Desta vez, no Sun Stage, o último show da noite foi do Stratovarius. Nesta apresentação, a banda mostrou que poderia estar facilmente em um dos palcos principais, visto que o público era enorme (provavelmente o maior deste palco) e era praticamente impossível transitar por ali. Foi ótimo rever e ouvir “Speed of Light”, “Paradise”, “Father Time”, “Black Diamond” entre outras canções executadas por Timo Kotipelto (voz), Jens Johansson (teclado), Lauri Porra (baixo), Matias Kupiainen (guitarra) e Rolf Pilve (bateria).
E no Waves Stage, em um show mais intimista e lotado, o Evergrey encerrou em grande estilo com seu prog metal a primeira edição do Summer Breeze Brasil.
O saldo desta primeira edição foi positivo em todos os aspectos (local, organização, bandas, atrações paralelas, etc.) e esperamos em breve por anúncios da versão 2024.
(Agradecimentos à produção do Summer Breeze Brasil e Agência Taga)
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